A proposta estabelece regras para a operação das casas de apostas no Brasil e taxação de 12% sobre as empresas; e de 15% sobre os prêmios obtidos por apostadores — abaixo do defendido pelo Ministério da Fazenda (veja mais abaixo).
O colegiado aprovou, ainda, um requerimento que pede urgência para votação da proposta, já aprovada pela Câmara, no plenário principal da Casa. Na terça (21), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sinalizou que o projeto já poderia ser incluído na pauta da sessão desta quarta.
Relator da proposta, o senador Angelo Coronel (PSD-BA) disse acreditar que o projeto deverá ser votado em plenário somente na próxima semana.
As regras propostas devem valer para as chamadas apostas de cota fixa em eventos esportivos reais — ou seja, jogos em que o apostador sabe, no momento da aposta, quanto poderá ganhar em caso de acerto. Também é válida para eventos de jogos online, como cassinos.
O projeto é uma das apostas do Ministério da Fazenda para elevar o caixa da União no próximo ano. A Fazenda tem articulado a aprovação de propostas que ajudem a alcançar a meta fiscal de déficit zero nas contas públicas em 2024 — sem aumento da dívida pública para cumprir gastos e investimentos.
Entenda a seguir, nesta reportagem, os principais pontos da proposta:
Requisitos para operar - O texto aprovado prevê um processo de autorização e uma série de requisitos para empresas de apostas online. Caberá ao Ministério da Fazenda permitir as operações.
Para solicitar a permissão, a empresa deverá ter sede e ser constituída no Brasil. O processo terá como base a análise de documentos, da reputação e da capacidade técnica e financeira da empresa.
Em seu parecer, o relator propõe que a empresa terá de contar com um brasileiro como sócio, que tenha, no mínimo, 20% do capital social.
Também prevê que sócios ou o acionista controlador da casa de aposta não poderão participar, direta ou indiretamente:
- De Sociedade Anônima de Futebol (SAF) ou organização esportiva profissional;
- Como dirigente de equipe desportiva brasileira;
- E de instituições financeiras e de pagamento que processem as apostas.
O procedimento de autorização e de manutenção da operação deverá levar em conta a disponibilização:
- De canais de atendimento aos apostadores e ouvidoria;
- Mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo e à proliferação de armas de destruição em massa;
- Ações pMara prevenir vício de apostas;
- E mecanismos para garantir a integridade e evitar a manipulação de apostas.
Licença de operação - Ao se credenciar, a empresa terá que pagar uma licença de operação no Brasil. Segundo o texto, as casas de apostas online pagarão até R$ 30 milhões, a depender de regulamentação posterior do Ministério da Fazenda.
A autorização será válida para até 3 marcas comerciais, e por 5 anos.
Em setembro, a proposta aprovada pela Câmara estabeleceu o mesmo valor de licença, mas com validade para somente uma marca, e por até 3 anos.
Angelo Coronel introduziu, ainda, a possibilidade de que a Caixa Econômica Federal, por meio das lotéricas, se credencie para comercializar as apostas de cota fixa nos meios físico e virtual. A autorização será concedida pelo Ministério da Fazenda.
Tributação - Em uma alteração contrária ao desejo do Ministério da Fazenda, o senador Angelo Coronel definiu, em seu parecer, novas alíquotas para a tributação do mercado de apostas.
A carga tributária será de 12% sobre as casas de apostas; e de 15% sobre os prêmios obtidos por apostadores.
As alíquotas propostas são menores do que as aprovadas pela Câmara e sugeridas inicialmente pela equipe econômica do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Antes, seriam 18% para as casas esportivas; e até 30% para os prêmios de pessoas físicas.
A mudança aprovada pela CAE deve impactar a projeção inicial de arrecadação da Fazenda com a proposta (R$ 700 milhões no próximo ano). Líder do governo na Casa, o senador Jaques Wagner (PT-BA) disse que a Fazenda deverá fazer novos estudos e que não houve "contencioso" com a redução das cobranças.
O relator disse ter feito a mudança para atrair apostadores e empresas interessadas no mercado nacional.
No caso dos apostadores, a cobrança ocorrerá somente uma vez por ano e será pelo Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).
A tributação vai incidir somente sobre os ganhos — descontado o valor apostado — que superarem a tabela de isenção do IR (atualmente em R$ 2.112).
Já as casas de apostas serão tributadas com base no valor arrecadado – após os descontos do pagamento dos prêmios e do IR sobre os prêmios – com as apostas. No total, a alíquota cobrada será de 12%.
Além da alíquota, a divisão do montante arrecadado com as empresas de apostas também sofreu alterações em relação ao aprovado pela Câmara:
- 10% para o Ministério da Educação;
- 14% para a área da segurança pública, como o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) e o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron);
- 36% para a área do esporte, como o Ministério do Esporte e comitês esportivos;
- 10% para a seguridade social;
- 28% para a área do turismo, como a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur) e o Ministério do Turismo;
- 1% para o Ministério da Saúde;
- 0,50% para entidades da sociedade civil, como a Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Fenapaes), a Federação Nacional das Associações Pestalozzi (Fenapestalozzi) e a Cruz Vermelha Brasileira;
- E 0,50% para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol).
Quem não pode apostar - A proposta proíbe que sejam apostadores:
- Menores de 18 anos de idade;
- Proprietário, administrador, diretor, pessoa com influência significativa, Gerente ou funcionários da casa de aposta;
- Agente público com atribuições diretamente relacionadas à regulação;
- Pessoa que tenha ou possa ter acesso aos sistemas informatizados da casa de aposta;
- Pessoa que tenha ou possa ter qualquer influência no resultado do objeto da aposta;
- Pessoas previstas em regulamentação posterior do Ministério da Fazenda;
- E pessoas diagnosticadas com ludopatia, por laudo de profissional de saúde mental habilitado.
O texto de Angelo Coronel determina, ainda, que a empresa deverá adotar tecnologia de identificação ou reconhecimento facial, para verificar a identidade do apostador.
Prêmios - Segundo a proposta, o apostador terá até 90 dias para resgatar o prêmio. O prazo será contado a partir da data de divulgação do resultado.
Metade dos prêmios "esquecidos" será repassada para o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Outra parte, para o Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap)
Angelo Coronel incluiu que, no mínimo, 10% dos recursos destinados ao Fies deverão ser direcionados para estudantes das populações do campo e de povos originários — indígenas e quilombolas.
Segundo a proposta, poderão ser suspensos os pagamentos de prêmios que estiverem sob investigação por manipulação de resultados ou corrupção.
Publicidade - O projeto também estabelece a criação de regras para campanhas publicitárias do setor. As regras vão constar de regulamentação posterior do Ministério da Fazenda.
O texto estabelece, porém, que as campanhas serão proibidas:
- Para empresas que não têm autorização para operar
- De exibir afirmações infundadas sobre possíveis ganhos em apostas
- De apresentar as apostas como atrativo social
- De veicular afirmações de celebridades sobre benefícios das apostas
- De sugerir que as apostas são uma alternativa financeira
- de ofender crenças culturais
Nas regras que serão criadas pela Fazenda, deverão estar previstas determinações para incluir:
- Avisos de desestímulo ao jogo
- Advertência sobre malefícios das apostas
- Ações informativas de conscientização dos apostadores
- Ações de prevenção ao vício em apostas
- E restrições de horário e veículos de exibição das campanhas
Relator da proposta, o senador Angelo Coronel (PSD-BA), afirmou que as regras não vão impedir a publicidade das casas de apostas em camisetas de clubes de futebol.
Fiscalização - O texto prevê que o Ministério da Fazenda será responsável por fiscalizar o setor. Entre as infrações previstas, está o incentivo à fraude esportiva.
A proposta estabelece alguns tipos de punição para quem desrespeitar a lei, isolada ou cumulativamente:
- Advertência para empresas, multa de 0,1% a 20% sobre a arrecadação do ano anterior. O valor máximo é de R$ 2 bilhões;
- Em casos de pessoas físicas ou associações que não exerçam atividade empresarial, a multa varia entre R$ 50 mil a R$ 2 bilhões;
- Suspensão parcial ou total das atividades por até 180 dias;
- Cassação da autorização ou proibição de conseguir nova autorização;
- Proibição de realizar novas atividades;
- Proibição de participar de licitações por pelo menos cinco anos;
- E impedimento para assumir cargo em empresas de apostas.
A punição vai depender, por exemplo, da gravidade e duração da infração, do valor e da reincidência.
O projeto aprovado também estabelece que as empresas serão obrigadas, por exemplo, a adotar mecanismos de segurança para coibir manipulações e usar sistemas auditáveis, que poderão ser acessados em tempo real pelo Ministério da Fazenda.
A casa de aposta deverá ainda criar mecanismos para monitorar suspeitas de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo, e comunicar ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) as operações suspeitas.
Além disso, há obrigação de criar mecanismos de proteção ao apostador e ao vício em apostas.
Pela proposta, todos os jogadores terão assegurados os direitos previstos em lei aos consumidores. Também deverão ter garantidas informações e orientações:
- Sobre regras e requisitos para premiação
- E sobre riscos de perdas e vício em jogos
Reporto - Inicialmente, o parecer de Angelo Coronel previa, a pedido dos ministérios da Fazenda e dos Portos e Aeroportos, um dispositivo para prorrogar, por 5 anos, o programa de isenção tributária para investimentos em infraestrutura portuária, chamado Reporto.
A iniciativa se encerra em dezembro deste ano. Pelo texto, que irá para a Câmara, o programa poderá seguir até 31 de dezembro de 2028.
Matéria especial do Globo.com